Discussões atuais sobre a exclusão do ICMS da base de Cálculo do PIS e da COFINS

  1. Autuações realizadas pela Receita Federal sobre a “suposta” base de cálculo majorada destas contribuições

 

No final do mês de julho foi noticiado que a Receita Federal estaria autuando as empresas no que diz respeito à contabilização dos créditos de PIS e COFINS ante a não exclusão do ICMS embutido no valor de aquisição dos bens e serviços utilizados como insumo, destinados ao ativo imobilizado e os adquiridos para revenda.

 

 

  • A base legal do direito ao crédito e a base legal utilizada nas autuações

 

O direito ao crédito das referidas contribuições está previsto no artigo 3º das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003, as quais estabelecem que estes serão calculados em relação:

 

  1. Aos bens adquiridos para revenda, salvo as exceções expressamente referidas na legislação em comento;
  2. Bens e serviços utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda entre outros ali previstos como àqueles destinados ao ativo imobilizado.

 

A base legal utilizada para referidas autuações é o artigo 167 da Instrução Normativa da Receita Federal de número 1.911/2019, a qual, alterando a Instrução Normativa 404/2004, passou a estabelecer que, para efeito de cálculo dos créditos decorrentes da aquisição de insumos, bens destinados a revenda ou bens destinados ao ativo imobilizado, integram o valor de aquisição (i) o seguro e o frete pagos na aquisição, quando suportados pelo comprador; e (ii) o IPI incidente na aquisição, quando não recuperável”.

 

Como pode ser verificado pelo texto transcrito acima, a Instrução Normativa 1911/2019 retirou o ICMS do valor de aquisição de tais produtos, para fins de crédito das contribuições, o qual estava previsto expressamente na Instrução Normativa 404/2004.

 

  • Posicionamento do Poder Judiciário sobre o tema

 

Recentemente foi publicada uma decisão de mérito sobre esse assunto pelo Tribunal Regional Federal da Terceira Região, o qual é responsável pelas ações judiciais de interesse da União nos estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul.

 

Trata-se da ação iniciada pela empresa “Color Visão do Brasil Indústria Química Ltda”, visando manter o ICMS no valor de aquisição dos seus insumos para fins de cálculo dos créditos do PIS e da COFINS.

 

A decisão foi julgada de forma favorável ao fisco em sentença de primeira instância, mas alterada em sede recursal sob os fundamentos a seguir descritos:

 

(…)

7.Pleiteia a impetrante o reconhecimento de seu direito de calcular os créditos de PIS/COFINS sobre a aquisição de insumos com a inclusão do ICMS, dado o risco de a Administração Fazendária exigir postura diversa agora com o entendimento firmado pelo STF. Deveras, não só a União Federal corroborou os fundamentos utilizados pelo Juízo de Primeiro Grau, como, recentemente, a Receita Federal editou com a IN RFB 1.911/19, suprimindo textualmente a possibilidade de inclusão do ICMS como valor de aquisição de insumos.

  1. A princípio, a exclusão do ICMS no creditamento do PIS/COFINS tem sua lógica no decisum prolatado no RE 574.706. Explica-se. Ainda que diversa do regime atribuído ao IPI e ao ICMS, a sistemática não cumulativa do PIS/COFINS tem sim por pressuposto evitar a incidência em cascata do tributo; procura neutralizar ou reduzir a tributação incidente sobre a receita de agente em posição anterior na cadeia econômica, por meio de assunção de créditos a partir de determinados custos de produção, como custos de aquisição de insumos.
  2. Excluídos os valores de ICMS da apuração das contribuições de PIS/COFINS suportados por aqueles agentes, e se tendo em mente que a incidência múltipla é justamente o pilar que justifica o sistema não cumulativo, deduz que os mesmos valores não poderiam ser computados para fins de creditamento, preservando-se a harmonia do sistema.
  3. Ocorre que o tratamento administrativo conferido aos valores de IPI incidentes na operação contrasta a aludida conclusão a novel IN RFB 1.911/19. Na forma da normativa administrativa citada, os valores de IPI não recuperáveis compõem o custo de aquisição para fins de creditamento do PIS/COFINS, pois como o IPI relativo à aquisição de bens para revenda não é recuperável, uma vez que a consulente afirma não estar enquadrada no conceito de estabelecimento industrial e nem no conceito de estabelecimento equiparado a industrial, o valor a esse título destacado constituí custo do revendedor. Consequentemente, o IPI destacado pelos seus fornecedores nas notas fiscais de venda poderá ser computado no cálculo do crédito da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS” (Solução de Consulta COSIT 579/17).
  4. Desde a disciplina da LC 70/91, o IPI incidente na operação de venda não integra a base de cálculo daquelas contribuições para o s contribuintes de direito daqueles tributos (art. 2º, a), o que agora ganha esquadro nas Leis 9.718/98 e nas Leis 10.637/02 e 10.833/03, e, por referência, no artigo 12, §4º, do Decreto Lei 1.598/77. A própria Administração Fazendária milita na mesma direção, conforme Solução de Consulta COSIT 03/19.
  5. Ou seja, ainda que o IPI não componha a base de cálculo do PIS/COFINS devido pelo contribuinte de direito ou pelo responsável tributário daquele imposto (o industrial, por exemplo), o adquirente daquele produto poderá considerar como custo de aquisição tanto o seu preço quanto o valor do IPI incidente na sua saída, até porque é efetivamente o custo enfrentado pelo adquirente.
  6. Não se tem aqui parametrização entre a base de cálculo das contribuições apuradas pelo industrial, enquanto agente da cadeia econômica (o preço do produto, excluído o IPI), e a base de cálculo para fins de crédito de PIS/COFINS pelo adquirente para revenda. (o preço do produto mais os valores de IPI incidentes), sem que isso se repute qualquer ilegalidade ou assimetria. Admitida a situação para o IPI, não se vê o porquê de, em sede exclusivamente administrativa, refutar igual tratamento para o ICMS, também um custo para o adquirente e ausente fundamento para tanto – mesmo após intimada a União Federal a prestar esclarecimentos.
  7. Lembre-se que um dos fundamentos utilizados pelo STF para afastar a exigibilidade do PIS/COFINS sobre valores de ICMS foi justamente a não incidência daquelas contribuições sobre o IPI, na qualidade de ingresso contábil destinado ao tesouro federal. É o que se depreende do voto do Min. Marco Aurélio quando do julgamento do RE 240.785 (STF – Pleno / Min. Marco Aurélio / 08.10.2014). O referido julgado foi utilizado como referência para a tese fixada no RE 574.706, como se depreende do voto da E. Relatora Minª Carmem Lúcia, do próprio Min. Marco Aurélio, e da Minª Rosa Weber.
  8. Dada a simetria do tratamento tributário conferido aos impostos mencionados quanto à base de cálculo do PIS/COFINS, firme na tese de que configuram transitório ingresso contábil, e admitida a qualidade de custo de aquisição quanto ao IPI incidente na venda ainda que não componente da base de cálculo daquelas contribuições, não se vê justificativa para a diferenciação almejada pelo Fisco quanto ao ICMS que naõ, aparentemente, a tentativa de minimizar as perdas decorrentes da decisão proferida no RE 574.706.
  9. Em suma, não pode a Administração Tributária, por si só, modificar seu posicionamento sobre o ICMS e a assunção de créditos de PIS/COFINS tomando por fundamento situação jurídica que se encontra e sempre se encontrou também presente para o IPI e sobre a qual nunca fez qualquer ressalva. Novidade nesse sentido somente poderia ser vinculada por lei, obediente o regime não cumulativo à legalidade tributária.
  10. Assim, fica reconhecido o direito de a impetrante apurar os créditos de PIS/COFINS a partir dos custos de aquisição de insumos incluídos os valores de ICMS incidentes na operação.”

 

No que diz respeito a possibilidade ou não de concessão de liminar sobre o assunto, verificamos a existência de decisão prolatada em ação interposta por outra empresa, , a qual visava apurar seus créditos de PIS e COFINS aplicando a alíquota das referidas contribuições sobre o valor total da nota fiscal de compra sem excluir a parcela referente ao eventual crédito recuperável de IPI.

 

Nesse caso o tribunal entendeu ser vedada a concessão de liminar que possibilite o aumento da base de cálculo de créditos tributários, pois isso se caracterizaria como uma espécie de compensação, o que não é possível de ser concedido em sede de liminar, apenas através de decisão transitada em julgado[1].

 

  1. As rescisórias iniciada pela Fazenda em face de decisões judiciais transitadas em julgado favorável aos contribuintes

 

Também foi noticiado que a Fazenda Nacional iniciou ações rescisórias em face de decisões judiciais transitadas em julgado, cujos processos foram iniciados após o dia 15.03.2017, data em que o Supremo Tribunal Federal reconheceu a inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS da COFINS

 

Isso porque, no julgamento dos embargos de declaração opostos pela Fazenda, o que ocorreu dia 12.05.2021, o STF modulou os efeitos da referida decisão, limitando os efeitos do reconhecimento dessa inconstitucionalidade aos fatos ocorridos após o dia 15.03.2017, ressalvado o direito de quem já havia ingressado com a ação até tal data.

 

Desta forma, o posicionamento da Receita Federal é que, para quem iniciou a ação após o dia 15.03.2017, o direito de excluir o ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS fica restrito aos fatos ocorridos após tal data e não aos cinco anos anteriores à distribuição da ação.

 

Em uma das decisões concedidas pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região, foi ressaltado que, o Código de Processo Civil estabelece a inexigibilidade de obrigação reconhecida em sentença fundada em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo STF, ou fundado em aplicação ou interpretação de norma tida pelo Supremo como inconstitucional, sendo que em casos de sentença transitada em julgado, cabe ação rescisória, como as iniciadas pela Fazenda Nacional sobre esse assunto.

 

De qualquer forma esta discussão está sendo iniciada e precisará ser melhor discutida no judiciário.

 

 

 

 

[1] Código Tributário Nacional – Art. 170-A. É vedada a compensação mediante o aproveitamento de tributo, objeto de contestação judicial pelo sujeito passivo, antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial

Compartilhe